Investigação sorológica para borrelia burgdorferi sensu lato em uma série de casos de síndromes neurológicas no estado do Piauí

ABSTRACT

A doença de Lyme é a zoonose mais prevalente no hemisfério Norte, causada por Borrelia burgdorferi s.l. e transmitida por carrapatos do complexo Ixodes ricinus. Caracteriza-se por uma infecção multissistêmica com manifestações dermatológicas, neurológicas, cardíacas e músculo-esqueléticas. No Brasil, é descrito uma síndrome semelhante conhecida como Doença de Lyme-Símile ou Síndrome de Baggio-Yoshinari, provavelmente ocasionada por uma espiroqueta atípica não cultivável, que difere da doença de Lyme em aspectos epidemiológicos, clínicos e laboratoriais. O presente estudo tem como objetivo investigar a reatividade sorológica (IgM/IgG) para B. burgdorferi s.l. em casos de síndromes neurológicas (polirridiculoneurite, encefalite, mielite transversa ou meningite), bem como descrever as reações cruzadas com agentes bacterianos e virais (Campylobacter jejuni, Citomegalovírus, Herpes-Vírus Simples tipos 1 e 2, Vírus Epstein-Barr, Vírus Varicela-Zoster e arbovírus). A população de estudo foi constituída por 117 indivíduos com síndrome neurológica atendidos no estado do Piauí no período de janeiro de 2015 a dezembro de 2017. Para avaliar a ocorrência de anticorpos IgM e IgG contra B. burgdorferi foram realizados e comparados dois testes sorológicos (ELISA comercial e ELISA in-house), sendo que em caso de positividade foram confirmados pelo Western Blotting. A análise de concordância foi realizada pelo teste Kappa. De acordo com os dados das fichas de notificação, observou-se que a maioria dos pacientes eram do sexo masculino (55,6%) com idade mais frequente de 20 a 39 anos (32,5%), da cor parda (41,9%), com ensino fundamental incompleto (18,8%), apresentavam profissões diversas (30,8%), residiam em zona urbana (78,6%) no município de Teresina (40,2%). Considerando as informações de manifestações clínicas, verificou-se que houve mais manifestações sistêmicas do que manifestações neurológicas em todas as síndromes analisadas. O percentual de positividade para B. burgdorferi nas síndromes neurológicas investigadas foi de 23,07% para IgM e 4,27 % para IgG no ELISA comercial, e de 18,80% para IgM e 5,98% para IgG no ELISA in-house. O nível de concordância entre os testes foi considerado bom para IgM (p<0,0001) e fraco para IgG (p≥0,1009). Das amostras positivas nos testes de ELISA 40 foram submetidas ao Western Blotting, sendo 27 confirmadas pelos critérios brasileiros. Comparando os resultados de detecção de IgM para B. burgdorferi e outros patógenos, pôde-se observar que houve reação cruzada com todos os patógenos investigados nos dois testes (ELISA comercial e ELISA in-house). Mais estudos são necessários para o avanço na produção de testes laboratoriais específicos capazes de esclarecer a presença de borreliose no Brasil.