Viabilizando tecnologias improváveis: uma análise sobre o fomento de contraceptivos masculinos pela ONG Male Contraception Initiative / Making feasible technologies unlikely: An analysis on the promotion of male contraceptives by the NGO Male Contraception Initiative

RESUMO

O lançamento de uma "pílula masculina", um contraceptivo reversível voltado para os homens com eficácia equivalente à da pílula anticoncepcional feminina, já foi anunciado diversas vezes desde a década de 1970. Esse produto nunca chegou ao mercado, mas a sua presença na mídia foi recorrente ao longo dos anos e a promessa de que ele finalmente seria lançado foi sendo renovada a cada década. Atualmente, presenciamos mais um momento de otimismo em relação a sua disponibilização. Diversos meios de comunicação anunciam o desenvolvimento de vários anticoncepcionais masculinos reversíveis e afirmam que eles podem estar no mercado nos próximos anos. Para além da possibilidade do seu lançamento, o objetivo da presente pesquisa é analisar o trabalho para a viabilização dessas tecnologias realizado por um ator de destaque no campo da contracepção masculina, a ONG estadounidense Male Contraception Initiative (MCI). O propósito desta organização é permitir o desenvolvimento de contraceptivos masculinos e demonstrar a demanda existente para tais artefatos. Para isso, atua provendo recursos técnicos e financeiros para pesquisadores e constitui-se como um centro para conectar, informar e engajar defensores dessas tecnologias. O processo de viabilização de anticoncepcionais masculinos reflete e materializa a atual configuração das relações de gênero no âmbito da contracepção e aspectos a ela relacionados. Deste modo, ele nos parece, nos termos de Lévi ­Strauss, "bom para pensar" questões como (bio)medicalização dos corpos masculinos; políticas populacionais; masculinidades contemporâneas; paternidade; e direitos reprodutivos. A partir de uma abordagem socioantropológica, utilizamos a técnica de análise de documentos para compreender como a MCI atua para a produção e a aceitação de tais tecnologias e que sentidos atribui a elas quando aponta a necessidade da sua disponibilização no mercado. Foram utilizados textos publicados no site da organização, na sua página na rede social Facebook e textos midiáticos que citam a MCI ou são de autoria de algum dos seus membros, assim como os vídeos produzidos pela ONG e disponibilizados pelo YouTube