É possível manter a neutralidade na psicoterapia online no contexto da pandemia?

As medidas de isolamento impostas pela pandemia de covid-19 geraram uma importante mudança no enquadre psicoterápico, migrando da modalidade presencial para online. Essa situação promoveu reflexões quanto à técnica psicanalítica e levantou questões quanto à manutenção da neutralidade nessa modalidade de psicoterapia. Partindo de questionamentos suscitados a partir de uma pesquisa realizada pelas autoras em torno dos desafios da psicoterapia online, este artigo se debruçou sobre o conceito de neutralidade. Buscou refletir acerca da neutralidade na psicoterapia online no contexto da pandemia, retomando a história do conceito e propondo uma reflexão acerca dos efeitos de eventos como a pandemia no modo de compreender a neutralidade. Percebeu-se que a essência do conceito não se alterou, mas que ideias referentes à ampliação do setting, à elasticidade da técnica e ao trauma compartilhado têm sido incorporadas à compreensão de neutralidade, contribuindo para o desenvolvimento da técnica psicanalítica em consonância com as mudanças sociais

The covid-19 pandemic and subsequent isolation measures have brought about a significant shift in the landscape of psychotherapy, transitioning from in-person sessions to online platforms. This situation has prompted reflections on the psychoanalytic technique and raised questions about maintaining neutrality in this mode of therapy. Building on inquiries arising from a research study conducted by the authors on the challenges of online psychotherapy, this article delves into the concept of neutrality. It seeks to reflect on neutrality in online psychotherapy within the context of the pandemic by revisiting the history of the concept and proposing a contemplation on the effects of events such as the pandemic on our understanding of neutrality. It was observed that the essence of the concept remained unchanged, but ideas related to expanding the therapeutic setting, the flexibility of the technique, and shared trauma have been incorporated into the understanding of neutrality. This contributes to the development of the psychoanalytic technique in harmony with social changes

Escutando Laura: o desafio de treinar a escuta psicanalítica

Este trabalho surgiu das discussões realizadas pelo Comitê de Psicologia

Clínica da Sociedade de Psicologia do Rio Grande do Sul.

Entendendo a importância e a complexidade de manter-se em atenção livre

flutuante (Freud) ou em um estado mental “sem memória, sem desejo e sem

necessidade de compreensão” (Bion) nas sessões de psicoterapia psicanalítica,

surgiu entre os autores o desejo de exercitar a escuta. Para tal utilizou-se uma

paciente da série televisiva In Treatment, por questões de sigilo. Apesar das

limitações implícitas nesta escolha ausência de impressões, reflexões, fantasias e

lembranças do terapeuta em relação à paciente optou-se por pensar este material

como se a paciente estivesse em atendimento por cada membro do grupo,

observando-se os pensamentos, emoções e reações dos participantes do comitê.

O trabalho aconteceu em três tempos: assistiu-se os episódios em grupo, leuse

a transcrição dos episódios e elaborou-se este artigo. As impressões obtidas são

apresentadas e discutidas à luz da teoria psicanalítica.

A realização deste exercício clínico evidenciou o quanto é difícil alcançar o

estado mental de reverie e paciência, como descritos por Bion, e a importância de

seguir exercitando a escuta em busca deste ideal de aprimoramento do método

psicanalítico (AU)