ABSTRACT
O presente artigo discute os sentidos da filiação para crianças abrigadas, vítimas de violência doméstica. O desejo dessas crianças de recuperar a filiação familiar é analisado como busca de um lugar psicossocial. As crianças abrigadas, que sofreram uma ruptura na filiação primeva e história de vida, flutuam entre vinculações efêmeras, sem referências de seu passado e sem pontos fixos e sólidos para seu assentamento no presente que lhes possam servir de guia ou de novas filiações. Tal condição de desfiliação é focalizada como tendência da sociedade contemporânea em afrouxar vinculações, movimentar os ancoradouros psicossociais e produzir desterritorializações, favorecendo uma subjetividade móvel, não identitária, desenlaçada de encaixes e conexões duradouros. Como conclusão, é apontada a continuidade histórica da vitimização da infância realizada pela condição de trânsito e passagem na qual vive, impeditiva de constituições de vínculos duradouros e sólidos que permitam uma suficiente estabilidade e segurança para a prospecção do mundo.