Minha análise com Freud: Reminiscências

Autor: Abram Kardiner. Editora: Quina, 2024,125 p

Ruth Mack Brunswick: Escritos reunidos

Organizador: Alexandre Socha. Editora: Quina, 2023, 264 p

Clínica extensa

Que é clínica extensa? É só a vasta medida em que o método psicanalítico ultrapassa a técnica analítica. Mas o que isso significa? Na presente conferência, o criador da noção procura defini-la. E o faz baseando-se em dois pontos: i. na diferenciação entre clínica extensa e clínica padrão; e ii. na recordação de que na obra de Freud a clínica extensa está presente do início ao fim. Argumenta que, se hoje a clínica extensa pode surgir como uma novidade, é porque a psicanálise restringiu-se ao consultório, deixando de usar como Freud usava o método psicanalítico para o estudo de todas as manifestações do psiquismo

What is extended clinical practice? It is merely the vast extent to which the psychoanalytic method takes precedence over analytic technique. But what does this mean? In this conference, the creator of the notion attempts to define it. He does so based on two points: i. differentiating extended from standard clinical practices; and ii. remembering that, in Freuds work, extended clinical practice is present from beginning to end. Herrmann argues that, if today the extended clinical practice arises as something new, this is because psychoanalysis had become restricted to the consulting room as analysts have ceased to use as Freud used the psychoanalytic method as a means to study all manifestations of the psyche

Sonhos (e outros): crônica de uma experiência de vórtice onírico

Este relato literário apresenta a dramaticidade de um sonho, na forma de uma crônica. Desnuda as complexidades das relações que se entremeiam no campo psicanalítico e que dão origem a um novo espaço, inconsciente, habitado pelo paciente e pelo analista. Formam-se significados que transcendem o individual de cada qual e que prosseguem em cocriação

This literary account, structured as a chronicle, explores the intensity and complexity of dreams and their intersection with psychoanalysis. It unveils how the unconscious space shared between the patient and the analyst becomes a fertile ground for creating meanings that transcend individual experiences. The narrative reveals how these psychoanalytic interactions contribute to the formation of new understandings and experiences, where both parties co-create a new psychological space

Como sustentar um futuro que nos falta?

Frente à interpelação “Como sustentar um futuro que nos falta?”, objeto de mesas-redondas em dois congressos, a autora procura desenvolver a ideia de que a poesia de Carlos Drummond de Andrade, o pensamento indígena desenvolvido por Ailton Krenak e a revolução freudiana podem ser articulados possibilitando fazer o enfrentamento dessa árdua questão, já que esses autores inspiram soluções libertadoras em relação à ideia da devastação ambiental. Junto a essa articulação, a autora propõe que este trabalho sirva de reflexão sobre a extensão da clínica psicanalítica aos dispositivos culturais elencados acima em sua implicação no mundo, ou seja, uma psicanálise implicada

Faced with the question “How can we sustain a future that we lack?”, the subject of round tables at two congresses, the author seeks to develop the idea that the poetry of Carlos Drummond de Andrade, the indigenous thought developed by Ailton Krenak and the Freudian revolution can be articulated in order to tackle this arduous question, since these authors inspire liberating solutions to the idea of environmental devastation. Along with this articulation, the author proposes that this work may serve as a reflection on the extension of the psychoanalytic clinic to the cultural devices listed above, in their implication in the world, in other words, an implicated psychoanalysis

Envelhecer: a solidão de existir?

O presente texto analisa a solidão e o envelhecimento sob uma lente psicanalítica e literária, explora casos clínicos e utiliza obras literárias como ferramentas de compreensão. Essa análise revela como diferentes perspectivas sobre o envelhecimento e a solidão são retratadas em obras literárias e experiências clínicas. Destaca-se o poder das narrativas pessoais como uma forma de conectar-se com os outros e encontrar compreensão mútua, mesmo diante do processo de envelhecimento

The text analyzes loneliness and aging from a psychoanalytic and literary lens, exploring clinical cases and literary works as tools for understanding. This analysis reveals how different perspectives on aging and loneliness are portrayed in literary works and clinical experiences. The power of personal narratives stands out as a way of connecting with others and finding mutual understanding, even in the face of the aging process

Adaptação antirracista é possível para combater o racismo ambiental

O texto traz uma reflexão que apresenta uma discussão sobre racismo ambiental, mostrando como a crise climática agrava desigualdades preexistentes. Um exemplo disso é a precariedade do saneamento básico, que afeta desproporcionalmente pessoas negras e periféricas, segundo dados do Censo 2022. A adaptação climática antirracista é apresentada como uma agenda essencial, articulada por uma rede nacional para enfrentar os impactos desiguais das mudanças climáticas e propor políticas públicas interseccionais e estruturantes. Essas políticas precisam considerar saberes ancestrais e garantir proteção às populações vulnerabilizadas, como negras, indígenas e quilombolas. Por fim, a autora destaca que não há como alcançar justiça climática sem justiça racial, criticando o negacionismo do racismo ambiental e reforçando a importância das lutas dos movimentos negros e indígenas na integração entre justiça social e ambiental

The text presents a reflection that discusses environmental racism, showing how the climate crisis exacerbates preexisting inequalities. An example of this is the precarious state of basic sanitation, which disproportionately affects Black and peripheral communities, according to data from the 2022 Census. Anti-racist climate adaptation is introduced as an essential agenda, coordinated by a national network to address the unequal impacts of climate change and propose intersectional and structural public policies. These policies must incorporate ancestral knowledge and ensure the protection of vulnerable populations, such as Black, Indigenous, and quilombola communities. Finally, the author emphasizes that climate justice cannot be achieved without racial justice, criticizing the denial of environmental racism and reinforcing the importance of the struggles led by Black and Indigenous movements to integrate social and environmental justice

Sobre a institucionalização da psicanálise no Brasil: transformações

Este trabalho analisa o processo de institucionalização da psicanálise no Brasil, com foco no problema da criação dos cursos de bacharelado que pretendem graduar psicanalistas. Esse cenário inédito implica o risco significativo de uma regulamentação da profissão de psicanalista, sem que a comunidade dos profissionais que a praticam e a transmitem no país dela participem. Em paralelo, a própria comunidade psicanalítica se vê pressionada pelos movimentos contracoloniais e identitários a repensar os dispositivos de formação, transmissão e ensino da psicanálise, de modo que se incluam em seus sistemas discursivos os problemas inerentes à sociedade brasileira em sua diversidade, e que se tornem acessíveis o tratamento e a formação psicanalítica às populações menos privilegiadas e, mesmo, subalternizadas, em busca de uma psicanálise comprometida com o ideal democrático de defesa universal dos direitos humanos

This paper analyzes the process of institutionalization of psychoanalysis in Brazil, focusing on the problem of the bachelors degree creation programs that aim to graduate psychoanalysts. This unprecedented scenario implies the consequent risk of regulating the profession of psychoanalysis without the participation of the professional community who practice and transmit it around the crountry. At the same time, the psychoanalytic community finds itself under pressure from anti-colonial and identity movements to rethink the mechanisms of training, transmission, and teaching of psychoanalysis, in order to include in its discursive systems the problems inherent to Brazilian society in its diversity and to make psychoanalytic treatment and training accessible to less privileged and even subalternized populations, seeking for a psychoanalysis committed to the democratic ideal of universal defense of human rights

Um psicanalista nas redes, enredado está?

Em um mundo no qual a virtualidade faz parte do cotidiano de todos nós, a Internet e as redes sociais também passaram a integrar o ofício dos analistas. Tal fato colabora para a possibilidade de transmissão e de democratização da psicanálise, mas também traz alguns riscos no que diz respeito a uma demasiada assimilação às leis dos algoritmos e dos likes. Com base em uma pesquisa sobre incursões de psicanalistas em temas da cultura e nas mídias, a autora discute a presença dos analistas de hoje nas redes sociais

In a world in which virtuality is part of our daily lives, the Internet and social networks have also become part of the analysts work. This fact contributes to the possibility of transmission and democratization of psychoanalysis, but it also brings some risks with regard to too much assimilation to the laws of algorithms and likes. Based on research into psychoanalysts incursions into cultural and media topics, the author discusses the presence of todays analysts on social media

Reflexões sobre a linguagem na era digital

A questão que permeia este trabalho é se o digital com seu vasto poder algorítmico pode nocautear e até anular o potencial engendrador da vida psíquica que caracteriza a matéria que é objeto de nosso ofício e vida. Nesse sentido, perguntamo-nos se, diante dos propósitos do digital, a análise como prática com seus fins seria ainda possível

The question that permeates this work is whether the digital, with its vast algorithmic power, can knock out and even annul the engendering potential of the psychic life that characterizes the matter that is the object of our work and life. In this sense, we wonder whether, given the purposes of the digital, analysis as a practice with its own ends is still possible

Diário de uma escuta: Rodas de Conversa em torno do horror

Este artigo relata o trabalho de psicanalistas em um momento potencialmente traumático, o ataque terrorista em 7/10/2023 e a subsequente guerra entre Hamas e Israel. A Roda de Conversa foi o dispositivo grupal escolhido para lidar com o sofrimento vivido. Utilizaremos falas dos participantes para destacar a potência desse trabalho na elaboração psíquica

The article reports on the work of psychoanalysts in a potentially traumatic moment, the terrorist attack on 10/7 and the subsequent war between Hamas and Israel. The Conversation Circle was the group device chosen to deal with the suffering experienced. We will use participants statements to highlight the power of this work in psychic elaboration

Pedras lançadas: em busca de uma psicanálise reconhecível, mas nova

Este trabalho utiliza o referencial da psicanálise contemporânea, considerando que a mente não é uma estrutura fixa, mas criada indefinidamente, à medida que ganha vida nas experiências. Nesse sentido, enquanto nossa mente se movimenta e se transforma na atividade clínica, há uma psicanálise original sendo criada também? Escolhi ilustrar essas ideias a partir do atendimento de crianças e adolescentes, cujos exemplos permitem registros mais concretos da relação dinâmica entre mundo psíquico, transformação e ação no mundo. Assim, eu mesma fiz alguns movimentos arriscados, descritos como pedras lançadas em busca de uma psicanálise reconhecível, mas nova. Relato três situações (contato com analistas reconhecidos, envio de caixa lúdica durante o lockdown e oferecimento da sala de atendimento como espaço de investigação) que ajudam a ilustrar o interjogo complexo e interligado entre realidade e subjetividade

This paper uses references from contemporary psychoanalysis. It understands the mind not as a fixed structure, but as indefinitely created as it gains life experience. While our mind moves and transforms itself during clinical activity, is there an original psychoanalysis being created as well? I chose to illustrate these ideas with children and adolescents care, since such examples allow more concrete records of the dynamic relationship among the psychic world, the transformation, and the action on the world. Therefore, I made some risky moves myself, described as thrown stones in search of a recognizable, but new psychoanalysis. I report three situations (contact with acknowledged analysts, shipment of a playful box during lockdown, and offering of an attention room as an investigation space) that help illustrate the complex and interconnected intergame between reality and subjectivity

Trauma na clínica psicanalítica: contratransferência e desmentido

Este artigo é uma reflexão sobre a contratransferência com base em uma vinheta clínica, articulada a reflexões sobre a escuta e elaboração da contratransferência, sob o ponto de vista das contribuições de Ferenczi, Klein e outros autores. Parte-se da noção de contratransferência como a forma de comunicação inconsciente do psiquismo do analisando capaz de mobilizar aspectos inconscientes do analista ainda não elaborados. Discute-se de que forma a contratransferência pode ser utilizada como um instrumento a favor do processo analítico e quais os riscos envolvidos nesse uso, incluindo a possibilidade de retraumatização do paciente por meio de desmentidos

The article is a reflection on countertransference based on a clinical vignette, linked to reflections on listening and elaborating countertransference, considering the contributions of Ferenczi, Klein and other authors. It starts from the notion of countertransference as the form of unconscious communication of the analysands psyche capable of mobilizing unconscious aspects of the analyst that have not yet been elaborated. It is discussed how countertransference can be used as an instrument in favor of the analytical process and what are the risks involved in this use, including the possibility of retraumatizing the patient through denials

Invenções analíticas

Este trabalho parte do atendimento de um paciente não neurótico, um paciente difícil, que, em função de seu quadro clínico marcado por atuações agressivas, exigiu tornar mais flexível o setting analítico padrão. O interesse maior está em descrever os manejos clínicos efetuados, bem como as dúvidas, fragilidades e criações surgidas ao longo dos anos trabalhados. A atenção a gestos mínimos de vitalidade psíquica, a sobrevivência à transferência agressiva, bem como o humor e a salutar passagem dos jogos à capacidade de brincar constituíram recursos necessários para a condução do caso e a manutenção de um vínculo capaz de inventar novas formas de conter a destrutividade. Por fim, salienta-se como a clínica de casos graves termina por ampliar nossas possibilidades de trabalho, auxiliando na formação de analistas criativos, orientados metodologicamente e compromissados com seus pacientes

This work begins with the care of a non-neurotic patient, a difficult patient who, due to his clinical condition marked by aggressive actions, required making the standard analytical setting more flexible. The greatest interest is in describing the clinical management carried out, as well as the doubts, weaknesses and creations that emerged over the years worked. Attention to minimal gestures of psychic vitality, survival of aggressive transference, as well as humor and the healthy transition from games to the ability to play, constituted necessary resources for managing the case and maintaining a bond capable of inventing new ways of containing destructiveness. Finally, it is highlighted how the serious cases clinic ends up expanding our work possibilities, helping to train creative analysts, methodologically oriented and committed to their patients

A escuta da subjetividade no encontro analítico em uma instituição psiquiátrica

Este trabalho discute a questão do “analista possível” com base no relato clínico de um atendimento realizado no serviço de psicoterapia dentro de um hospital psiquiátrico. Algumas das dinâmicas da dupla paciente e analista e as dificuldades com as quais deparamos quando o corpo sente os efeitos das violações sofridas que produziram um ego enfraquecido serão contempladas no contexto das relações transferenciais, contratransferenciais e da confiança que precisa ser instalada para o encaminhamento do trabalho psicanalítico

This work discusses the issue of the “possible analyst” based on the clinical report of a treatment provided in the psychotherapy service within a psychiatric hospital. Some of the dynamics of the patient and analyst duo and the difficulties we face when the body feels the effects of the violations suffered that produced a weakened ego will be considered in the context of transference and countertransference relationships and the necessary trust to forward the psychoanalytic work

A analista morta

A partir de sua experiência com um quadro depressivo grave, a autora analisa os impactos dessa condição em sua clínica e os pressupostos idealizados da psicanálise

Based on her experience with a severe depressive episode, the author analyzes its impacts on her clinical practice and the idealized assumptions of psychoanalysis